O Dia Internacional da Mulher, instituído em 8 de março, transcende o simbolismo das homenagens e comemorações. Mais do que celebrar a feminilidade e reconhecimento, a data carrega um profundo significado histórico, marcado pela luta pela emancipação cidadã, pela conscientização de classe e pela conquista de direitos das mulheres ao longo do século XX. Essa trajetória foi impulsionada, sobretudo, por mulheres operárias que desafiaram estruturas de opressão e reivindicaram condições mais justas de trabalho e de vida. Por isso, o 8 de março se consolida como uma data essencialmente política, lembrando que a igualdade e a justiça são conquistas que exigem resistência e mobilização contínuas. É dessa forma, que os movimentos feministas e a presente data, colocam as mulheres e meninas no centro da história, para que sejam conscientes de suas conquistas e reconheçam, na luta por direitos mais igualitários, a possibilidade de ocuparem papeis e espaços mais diversos, viabilizando condições para o presente e para as próximas gerações que virão. Afinal, a luta pela libertação das mulheres é a mãe de todas as lutas.
“Talvez cedo, talvez tarde. Será, contudo, quando houver bastante cultura e sólida independência entre as mulheres para que se considerem indivíduos. Só então, cremos existir uma civilização melhor” Antonieta de Barros (1901-1952), educadora, escritora, jornalista e política brasileira.
Mulheres e Trabalho: O histórico que deu origem a data
A proposta de criação de uma data internacional em homenagem a luta por direitos das mulheres, partiu de Clara Zetkin, ativista comunista alemã, em 1910, na Conferência Internacional de Mulheres Socialistas em Copenhague. A sugestão foi aceita, e a data passou a ser comemorada em 1911 em países como Áustria, Dinamarca, Alemanha e Suíça. Nesse mesmo ano, o trágico incêndio na fábrica Triangle Shirtwaist, em Nova York, resultou na morte de 146 trabalhadores, sendo 125 mulheres, evidenciando as condições precárias de trabalho de mulheres no interior das fábricas.
Em 1917, a Marcha das Mulheres Russas, liderada por operárias do setor têxtil em São Petersburgo, reivindicava “pão e paz” – melhores condições de vida e a saída da Rússia da Primeira Guerra Mundial. A mobilização cresceu ao longo dos dias, ganhando apoio de operários metalúrgicos e contribuindo diretamente para a Revolução Russa, que pôs fim a 300 anos de monarquia. A ONU só oficializou o Ano Internacional da Mulher em 1975 e, em 1977, instituiu oficialmente o 8 de março como Dia Internacional da Mulher.
Mais do que uma questão efervescente do século XX devido aos eventos destacados, a relação entre mulheres e trabalho remonta ainda ao século XVIII, quando pensadoras como Mary Wollstonecraft já questionavam a divisão sexual do trabalho, que mais tarde seria trabalhada por intelectuais socialistas como Zetkin e Alexandra Kollontai ampliando a crítica, relacionando-a diretamente às condições de trabalho e à luta por igualdade.
Brasil
A luta feminina no Brasil também ganhou força ao longo do século XX, impulsionada por movimentos que reivindicavam melhores condições de vida e trabalho. Um dos primeiros marcos desse processo foi a criação do Partido Republicano Feminino, em 1910, que surgiu como ferramenta de defesa da emancipação das mulheres.
Essa inserção na política influenciou diretamente na conquista do direito ao voto mobilizado pelas sufragistas durante a Constituinte de Vargas, em 1932, abrindo caminhos para novas pautas de igualdade política e trabalhista.
Trinta anos depois, em 1962, a Lei nº 4.212 trouxe avanços significativos, permitindo que mulheres casadas trabalhassem sem a autorização do marido e assegurando direitos à herança e à guarda dos filhos. No mesmo ano, a chegada da pílula anticoncepcional ao Brasil representou uma revolução na autonomia feminina, oferecendo às mulheres maior controle sobre seu próprio corpo e planejamento familiar.
Em 1974, a aprovação da Lei de Igualdade de Oportunidade de Crédito impediu a discriminação financeira por gênero ou estado civil. Pouco tempo depois, em 1977, a Lei nº 6.515 legalizou o divórcio, garantindo às mulheres o direito de romper casamentos indesejados e reconstruir suas vidas.
Entre os avanços mais significativos das últimas décadas, destaca-se a Lei Maria da Penha (Lei nº 11.340/2006), um marco no combate à violência doméstica. Fruto de intensa mobilização social, a legislação ampliou a proteção às mulheres e endureceu as punições contra agressores, consolidando-se como um passo essencial na luta por dignidade e igualdade de direitos no Brasil.
Relembrar o sentido para manter a luta viva
O Dia Internacional da Mulher, ao longo do tempo, teve seu significado político esvaziado, em grande parte devido à apropriação pela indústria e pelo comércio, que passaram a explorar a data para fins lucrativos. Esse processo resultou na desmobilização em torno das pautas fundamentais do 8 de março e afastou muitas mulheres dos debates feministas que a data originalmente buscava evidenciar, ocasionando certo desconhecimento sobre a trajetória política e cultural daquelas que vieram antes de nós – intelectuais, artistas, ativistas e pensadoras – e deixaram como legado as conquistas que nos beneficiamos hoje. Que consigamos nessa data, nos inspirar a partir do resgate da nossa trajetória de mobilização, ampliando a compreensão da luta feminina como um caminho para um mundo mais justo, pacífico e digno.
Um viva a todas as mulheres!
Comente