A viagem no tempo é um sonho para a ciência há muitos anos. Pesquisadores buscam concretizá-la de diversas formas, mas a lógica parece ser inimiga dos fãs de ficção cientifica. O “paradoxo do avô” é um cenário inventado que prova que ir ao passado pode não ser tão simples quanto se pensa.
O nome vem de sua descrição. Nele, uma pessoa viaja ao passado e mata o próprio avô antes de seu pai ou mãe nascer, o que impede a existência do viajante do tempo. Apesar do título, o paradoxo não é apenas sobre um sujeito matar seus antecessores, mas diz respeito a qualquer ação que altere o passado e crie uma contradição.
As primeiras menções a esse debate lógico estão em histórias escritas na década de 1930. Em uma carta à revista americana de ficção científica Amazing Stories, a trama aparece como “o antigo argumento de impedir seu nascimento matando seus avós”
Os enredos iniciais que tratam do paradoxo são o conto Ancestral Voices, de Nathaniel Schachner, publicado em 1933, e o livro Future Times Three, de 1944, de René Barjavel. Após eles, uma série de outras obras abordaram o tópico em vários graus de detalhe.
Paradoxo do avô: variações do mesmo conceito
O físico John Garrison cria uma nova versão do paradoxo com engenharia elétrica. Em seu modelo, um circuito eletrônico envia um sinal através de uma máquina do tempo para se desligar, porém, recebe o sinal antes de enviá-lo.
Uma variante mais histórica do problema é a do “paradoxo do assassinato de Hitler”. Bastante frequente na ficção, nele o protagonista viaja ao passado para abater Adolf Hitler antes que ele possa iniciar a Segunda Guerra Mundial. Nessa caso, o viajante não está impedido fisicamente, mas a ação remove qualquer motivo para a viagem.
Há também a abordagem de universos paralelos para a questão. Quando o sujeito mata seu avô, na verdade, está matando uma versão de seu antepassado em outro universo. Assim, seu mundo original permanece inalterado. Existe o argumento de que, como não é a mesma linha temporal do viajante, esse caso não seria uma autentica viagem no tempo.

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Olhares da filosofia e da ciência para o paradoxo
Mesmo sem a certeza física da possibilidade de viajar no tempo, é possível mostrar pela lógica como mudar o passado é uma contradição. A linha de pensamento é a seguinte: se é necessariamente verdade que o passado aconteceu de uma certa maneira, então é falso e impossível que o passado tenha ocorrido de qualquer outra maneira.
Um viajante do tempo seria incapaz de mudar o passado do jeito que ele é. Ele apenas agiria de uma forma que já fosse consistente com o que necessariamente aconteceu. Isso leva ao argumento de que a viagem temporal em si é paradoxal, portanto, logicamente impossível.
O filósofo Bradley Dowden apresentou esse tipo de argumento no livro Raciocínio Lógico. Nele, argumenta que a possibilidade de criar uma contradição exclui inteiramente a viagem para o passado.

Na física, o cientista Igor Novikov apresenta o princípio da autoconsistência. Nesse conceito, “loops” temporais são causais, ou seja, tudo que acontece nas viagens ao passado sustenta o presente em um ciclo. Isso pode ser visto na série de televisão Dark.
Sendo assim, qualquer coisa que um viajante do tempo faça no passado deve ter feito parte da história o tempo todo. O sujeito jamais poderá fazer nada para impedir que a viagem ao passado aconteça, pois isso é inconsistente.
Uma solução para o quebra-cabeça
Um novo estudo que combina relatividade geral, mecânica quântica e termodinâmica diz resolver, ao menos teoricamente, a questão. A pesquisa, publicada no periódico Classical and Quantum Gravity, é da autoria de Lorenzo Gavassino, físico da Universidade Vanderbilt.
A base para o artigo está na teoria da relatividade geral de Einstein. Nela, o espaço-tempo pode permitir curvas fechadas no tempo, possibilitando revisitar o passado. Fenômenos como os buracos negros já mostram que o tecido do espaço-tempo pode se comportar de forma contraintuitiva, o que colabora para que a teoria esteja certa.
O estudo atual sugere que, num universo onde toda a matéria estivesse em rotação, o espaço-tempo poderia se curvar para criar loops temporais. Como o “paradoxo do avô” é um problema em loop temporal, os resultados mostram que ele não seria impossível.

Física funcionaria diferente em loops temporais
A impossibilidade de viajar no tempo se dá principalmente pela entropia, a qual é a medida da desordem num sistema. “Pelo que sabemos, a entropia é a única razão pela qual lembramos os eventos passados e não conseguimos prever os futuros”, disse Gavassino ao site LiveScience.
Na proposição do cientista, as leis da termodinâmica se comportariam de forma diferente em um loop temporal. Nesse ciclo do tempo, surgiriam flutuações quânticas capazes de apagar a entropia, o que reverteria o envelhecimento e a morte, anulando paradoxos como o do avô.

“A maioria dos físicos e filósofos no passado argumentou que, se a viagem no tempo existir, a natureza sempre encontrará uma maneira de evitar situações contraditórias”, disse Gavassino.
O trabalho do pesquisador fornece a primeira derivação rigorosa do princípio da autossuficiência diretamente da física estabelecida. Ele tomou como base também a obra de Igor Novikov.
“Especificamente, apliquei a estrutura padrão da mecânica quântica, sem postulados adicionais ou suposições controversas, e demonstrei que a autossuficiência da história segue naturalmente das leis quânticas”, explica o físico.
Uma pesquisa capaz de quebrar barreiras
Apesar da estrutura teórica convincente, a existência de loops temporais no universo ainda é incerta. Cientistas, como Stephen Hawking, sugeriram que leis da física podem prevenir esses fenômenos com o espaço-tempo se tornando singular antes de um loop se formar, por exemplo.
Porém, explorar profundamente o debate teórico por trás de loops temporais é útil. Ir além dos limites atuais da ciência pode oferecer ideias sobre fenômenos reais já conhecidos, o que expandiria a compreensão humana sobre a física e o universo.
Fonte: olhardigital.com.br
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