Ao se encerrar a série “Sintonia”, a Netflix deixou claro que, muitas vezes, a ficção precisa refletir a crua realidade daqueles que a sociedade esqueceu. Em meio a tramas marcadas pela dualidade entre sonho e desilusão, os destinos dos três personagens principais se entrelaçaram para revelar um retrato dolorosamente verdadeiro da vida nas periferias. Contudo, foi na trajetória de Nando – jovem desprovido de pai e mãe, que encontrou no crime a única via de escape – que a série atingiu seu ponto mais doloroso e, ao mesmo tempo, mais esclarecedor.
Nando sempre foi um personagem que despertava empatia e inquietação. Crescido na ausência do afeto e do apoio familiar, ele se viu, desde muito cedo, refém de um ambiente que pouco oferecia em termos de oportunidades. A carência de referências e o isolamento social o conduziram a um caminho onde o crime se apresentava, erroneamente, como a única alternativa para se sentir pertencente. Enquanto seus amigos buscavam na música, na fé ou nos estudos um meio de resgatar suas identidades e sonhos, Nando afundava cada vez mais em um ciclo vicioso de violência e marginalidade.
A escolha da Netflix em não oferecer um “final feliz” para Nando, mesmo diante da pressão de um público que ansiava por redenção e transformação, foi uma decisão narrativa ousada e, acima de tudo, realista. Em vez de amaciar o impacto da história com finais engordativos e reconfortantes, a plataforma expôs a realidade nua e crua de quem escolhe o caminho do crime: não há retorno fácil, nem resgate heroico. Essa decisão não visa glorificar a tragédia, mas sim alertar para o fato de que, para muitos, a trajetória marcada pela violência e pela falta de oportunidades não permite finais de conto de fadas.
Ao longo de “Sintonia”, os três protagonistas – cada um representando caminhos distintos, mas igualmente repletos de desafios – espelharam a complexidade de uma juventude marginalizada. Enquanto Doni via na música a chance de reescrever seu destino e Ritinha encontrava na fé e no Direito a força para enfrentar a opressão diária, Nando representava o lado mais sombrio dessa equação. Sua história é um grito de alerta: quando a sociedade falha em proteger e oferecer alternativas, o crime se torna uma armadilha inexorável, onde a promessa de pertencimento esconde a realidade de um ciclo interminável de perdas e desilusões.
A escolha de não fechar a narrativa de Nando com um desfecho feliz nos obriga a olhar para o espelho e refletir sobre as causas profundas que alimentam essa espiral de violência. A falta de políticas públicas efetivas, a negligência histórica e a ausência de oportunidades para os jovens das periferias são elementos que, somados, forjam destinos tão trágicos quanto o de Nando. Assim, “Sintonia” se transforma não apenas em uma obra de entretenimento, mas em um convite urgente à conscientização e à ação social.
O fim da série é, portanto, muito mais do que o encerramento de uma trama ficcional. É o lembrete de que a sociedade precisa olhar com mais atenção para os jovens que, como Nando, não tiveram a chance de construir um futuro diferente. Que a narrativa não seja vista apenas como entretenimento, mas como um alerta para a necessidade de mudanças estruturais que permitam a transformação daqueles que vivem à margem.
Ao refletirmos sobre a trajetória de Nando, somos chamados a reconhecer que não há finais felizes quando se trata da vida daqueles que foram empurrados para o abismo pelo descaso social. Que essa dolorosa história inspire uma mobilização coletiva em busca de soluções reais, para que possamos, de fato, transformar destinos e construir um futuro onde a esperança e as oportunidades sejam a verdadeira rota de escape do ciclo do crime.
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