Mas afinal, o que é anistia?

Já tem alguns meses que a sociedade brasileira debate o tema “anistia” sem realmente ter uma percepção do seu significado e qual importância o uso deste termo jurídico tem para a população de uma maneira geral. Posicionamentos políticos de pessoas que se manifestam a favor ou contra estão inundando as mídias de uma maneira geral, levantando debates técnicos e até sem nenhum fundamento sobre o assunto. A verdade é que, segundo alguns pensadores contemporâneos, vivemos um período da história que está sendo chamada de “pós verdade”, onde a disseminação de informações falsas, desqualificadas e que distorcem a realidade estão gerando questionamentos sem fundamentos sobre a ciência, o conhecimento e até sistema político, como a democracia.
Diante deste contexto, o termo anistia deve ser entendido como uma prática jurídica/política que tem como objetivo o de não penalizar ou perdoar indivíduos que infringiram leis, seja por motivos políticos ou outras circunstâncias, podendo até anular condenações já estabelecidas. Enfim, de certa forma, o perdão ou anistia, abre um espaço perigoso para a estrutura de uma sociedade, seja ela qual for, que é a sensação de que o sujeito tem o direito de produzir atos ilegais e depois buscar do Estado um pedido de perdão pelos atos produzidos. Pelas leis brasileiras, este benefício precisa ser votado pelo Congresso Nacional e depois ser sancionada pelo Presidente da República.
Pedir anistia em qualquer circunstância é reconhecer que um crime foi cometido. Quando o ex-presidente militar João Batista Figueiredo sancionou em 1979 uma lei concedendo anistia para os envolvidos em “crimes políticos”, esta lei não buscava apenas o perdão aos brasileiros que lutaram contra a ditadura militar e pelo reestabelecimento da democracia, mas sim, isentar grupos de pessoas associadas ao regime da ditadura que prendem, torturou e assassinou muitos brasileiros que não aceitavam viver em um regime político de repressão e violência. Aqui no Brasil, diferentemente do que aconteceu na Argentina, crimes ocorridos durante ditadura, foram simplesmente perdoados. No caso da Argentina, a Corte Suprema do país declarou inconstitucional a lei da anistia e iniciou processos que responsabilizaram e condenaram militares por crimes cometidos durante a ditadura daquele país.
No contexto atual, pede-se anistia para os indivíduos que se envolveram nos ataques que ocorreram nos prédios dos três poderes em Brasília, no dia 08 de janeiro de 2023, evento em que os manifestantes depredaram prédios públicos, agrediram servidores da segurança federal e entoaram discursos contra o sistema democrático brasileiro, tentando encorajar as Forças Armadas a destituírem um governo legitimamente eleito pelo voto. Independentemente se as pessoas apoiam ou são contrários a qualquer governo que seja, o mandato deve ser respeito, pois é uma das premissas da democracia o respeito pela vontade popular. Esses eventos caracterizam uma tentativa de Golpe de Estado, ato punível pelo artigo 366, sobre crimes contra o Estado Democrático de Direito.
Sendo assim, a sociedade brasileira deve refletir se realmente é uma ação positiva para a sociedade brasileira, criar subsídios legais para eventos futuros como o que ocorreu em 08 de janeiro, perdoando os indivíduos por ações ilegais que são praticadas. Anistia pode se transformar em sinônimo de impunidade. Banalização de crime ou relativização de condutas ilegais, pode provocar instabilidade no sistema de leis de qualquer país. E esse caminho pode ser muito perigoso e incerto.